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EU-EXTRA-COTIDIANIZADO
Allan Maykson
No olho fecundo, atento e preciso
No lábio aberto e rasgado
Nos pulsos, nos moldes, no desenho
Nos pés, no centro, no contorcer.
No suor, no oxigênio e no gás carbônico
Na pausa, no eco, na sustentação
No homônimo interno e externo
No calor, no fogo, na pulsão.
No sintoma, no incidente, no não pensado
Na surpresa, no problema inesperado.
No foco, no fosco, no caco
No corpo, na rua, no palco...
28 de maio de 2016
Esta aula se trata da mesma sobre a qual já teci. É o momento em que estamos treinando a recitação de poemas extra-cotidianamente, então, não que eu não repita, tive uma ideia de discursar quase que empiricamente sobre minhas impressões de extra-cotidianidade.
Para início de conversa escrevi um poema que externa o meu pouco saber a respeito do tema. O corpo extra-cotidiano, conforme afere o prefixo "extra", diz respeito a um corpo que está além do esperado do dia-a-dia. Esse corpo vai causar estranhamento àqueles que o virem. Vai desinquietar, e essa desinquietação vai gerar uma poética, assunto sobre o qual podemos discorrer depois.
Vejamos os exemplos. Nessa primeira imagem temos um senhor lendo um jornal, de maneira bastante peculiar e cotidiana. Certamente ao passarmos por esse senhor, não levaríamos um susto, ou sua postura não nos causaria espanto.
Vejamos os exemplos. Nessa primeira imagem temos um senhor lendo um jornal, de maneira bastante peculiar e cotidiana. Certamente ao passarmos por esse senhor, não levaríamos um susto, ou sua postura não nos causaria espanto.
Vejamos esses rapazes lendo o jornal. Temos aqui dois corpos extra-cotidianos, tortos, com postura inadequada de um leitor de jornal, temos um desenho corporal, e o mais absurdo, ambos não têm cabeça. Não é de causar espanto, inquietação ou até mesmo humor? Isso é a marca do extra-cotidiano.
Não seria assustador vermos um contingente de pessoas andando por todos os lados da cidade, com pressa ou sem pressa, pessoas andando é uma ação cotidiana. Talvez uma outra estivesse correndo porque está atrasada ou porque acabou de ser assaltada, isso geraria sim certo desconforto, afinal, há um medo que ronda, porém, esse medo é cotidiano.
Certamente, se víssemos alguém caminhando desta forma pelas ruas iríamos reagir de alguma forma, excludente talvez, porque aquela ação não está em nossa memória, aquela informação não está contida no que entendemos como normal, como cotidiano. Esse desconhecido, essa anormalidade é o que entendemos por extra-cotianidade.

Esse corpo extra-cotidiano não é simplesmente executado. Há uma construção por de trás de toda essa obra corporal. O ator está imbricado de estímulos internos. A ação externa é produto de uma ação interna, de um movimento interno que pulsa por todo corpo, gerando a organicidade e afetando cada partícula do corpo do ator.
No bios-extra-cotidiano, assim como Grotowski (1988), dispensamos toda e qualquer ação periférica do corpo. A ação só é ação física quando há um constructo interno estimulador de um afeto ou como em Stanislavski (apud Zaltron, 2010), estimulador de uma memória emocional.
No bios-extra-cotidiano, assim como Grotowski (1988), dispensamos toda e qualquer ação periférica do corpo. A ação só é ação física quando há um constructo interno estimulador de um afeto ou como em Stanislavski (apud Zaltron, 2010), estimulador de uma memória emocional.
O corpo extra-cotidiano pode ser constituído por meio de diversas ferramentas das artes cênicas, a absorção, a visualização, a substituição, a fala interna. Vamos recortar essa última que é a que nos interessa porque esta diz respeito ao método utilizado para os poemas.
Os poemas escolhidos por nós trazem conteúdos de nós mesmos. Temos aí um material que gera pulsação antes de aplicarmos as ferramentas citadas acima. Para que consigamos declamar esses poemas com a teatralidade requerida, precismos costurar nos versos falas internas, que se tratam de pequenas expressões, se possível uma só palavra que, urgentemente, nos exija uma ação. Logo, temos o material físico que é poema escrito, em diálogo com o subtexto, o texto que o espectador não ouve, esse subtexto é o provocador de uma ação extra-cotidiana.
Gostaria de finalizar esse pequeno e simples ensaio com duas interpretações da canção Geni e o Zepelin, de Chico Buarque. Veremos o autor interpretando a música enquanto músico, cotidianamente, e depois, trago a interpretação da mesma canção pela atriz Letícia Sabatella, evidentemente carregada de estímulos internos implicando numa interpretação sem igual e completamente teatral da canção.
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Referências
GROTOWISKI, Jerzy. Sobre os métodos da ações físicas. FESTIVAL DE TEATRO DE SANTO ARNAGELO. 1988. Itália. Dsponível em: <http://www.grupotempo.com.br/tex_grot.html>. Acesso em maio/2016.
ZALTRON, Michele Almeida.,2010. A imaginação no método das ações físicas de K. Stanislávski. Programa de Pós-Graduação em Ciência da Arte – UFF.
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