"Todo jogo é social e propõe a solução de um problema, dentro das regras estabelecidas pelo grupo. Ao responderem a vários estímulos acidentais simultâneos, os jogadores ficam ágeis, alertas e dispostos. A capacidade individual de envolvimento com o jogo e lidar com estímulos múltiplos, medem o crescimento dessa habilidade do jogador. Todo esse esforço provoca a espontaneidade."
Viola Spolin
(disponível em: <https://improvisandoblog.wordpress.com/2009/11/10/viola-spolin-a-inovacao/> Acesso em 05/mai.)
Expressão de estranhamento da noite: "VAMOS RASCUNHAR AS CENAS!". Eu, imaturo que sou, pensei: mas já está tudo rascunhado, descrito no roteiro. Mas veja, eu faço teatro, logo, todo processo criativo trata-se de uma prática, obviamente. Nosso rascunho nada mais foi do que encenar sucintamente o espetáculo para construí-lo.
Não serei tão descritivo aqui como nas outras postagens, gostaria de externar as cenas que foram importantes e pontuar o que realmente é relevante para minha construção pessoal/profissional e também descortinar algumas sensações e insights à luz da teoria. Falando nisso, estou gostando desse meu engajamento enquanto pesquisAtor¹ em construção. Me descobrindo. Teatro é exatamente isso, esse passeio nos labirintos na psique que deixa rastros, cada vez que se vai mais fundo se desenterra desgraças para resignificar e tesouros para potencializar.
Antes de rascunhar a cena fizemos um breve aquecimento de introdução ao trabalho com jogos, jogando é claro. O "jogo da história", o qual conhecemos em nossa primeira aula dessa deliciosa disciplina. Estávamos mais exigentes, mais ágeis, nosso corpo perceptivo estava em alerta e foi com esse corpo que pude notar alguns pormenores a respeito de nossa maturação até aqui.
Depois de rascunharmos a última cena até mesmo para resgatarmos aquela energia passada, foi a hora de o Alberto, meu personagem, passar mal, tremer por ter sido envenenado pela Clarice após a discussão. A ação de tremer foi uma composição insurgente da aula de Voz I. Dei o nome dessa ação de "A notícia", usando-me de uma substituição: quando recebi a notícia de que meu avô havia falecido.
Mas como reativar aquela energia pulsante da aula de Corpo, afinal? Como já citado em outras postagens, recorro a Stanislavski quando trata do detalhe imaginativo, um acréscimo de conteúdo ao material interno para que possamos resgatar a vida, uma manutenção do subtexto. Podemos também inserir uma regra de jogo nova para resgatar essa vida da ação, para provocar a dilatação mental (BARBA, 1995). Mas é válido salientar também que, a substituição, por se tratar de trazermos a visualidade interna de uma questão nossa urgente ou uma questão catastrófica - como no meu caso -, pode por si só gerar a vida de que a cena carece, contudo, também é lícito sublinhar que a repetição dessa ação pode sim comprometer essa pulsação, daí precisamos nos recorrer às ferramentas herdadas por tantos teatrólogos.
A CENA DO HOSPÍCIO
Essa cena trata-se do momento em que Alberto recebe uma mensagem de Clarice via telepatia informando que ela o perdoou e que escondeu as joias na tão preciosa cadeira. Alberto, então, no meio da loucura do hospício cujos internos estão enfurecidos com a situação antecedente, grita para todos que tem um plano, então todos se movimentam para a fuga, fuga esta resultado da cena de Jogos criada por mim, Juliana e Caio com duas regras de jogo: aumentar o tom de voz gradativamente e trocar uma peça de roupa à medida que for falando.
Dessa vez a cena tinha muitos atores e nem todos se propuseram a cumprir com a segunda regra, então achei que a cena perdeu um pouco de potencial, em contrapartida, o contingente de "loucos" no palco promoveu uma plasticidade corporal e vocal muito intensa além das diversas visualidades de "quens" e suas respectivas ações.
Essa cena careceu de um esforço interno da minha parte, porque a primeira vez que a fizemos saímos do anfi-teatro envaidecidos de tão completa que foi a cena no sentido de plasticidade, visualidade, estrutura de jogo, organicidade, ação sobre o outro, alternância, enfim, foi uma cena que superou as nossas expectativas, logo, a preocupação em afetar como na última vez, teoricamente mais possível por conta do número de atores, foi imediata.
Lazzaratto (2000) trata em seus estudos sobre o campo de visão do corpo-perceptivo², um "corpo aberto a impregnações" sugerindo que o "ator deve compreender as coisas por meio de seu corpo: ação-reflexão-nova ação." Na referida cena essa foi exatamente a ferramenta que me utilizei para resgatar a energia, o fogo, a vida da cena. No palco que não tive a habilidade de criar uma nova regra de jogo, nem de fazer alguma substituição, mas o corpo-perceptivo me fez absorver as outras cenas e levou meu corpo a uma ação. A grande verdade é que essa lucidez súbita do Alberto o traria a razão de volta, contudo Alberto se permaneceu esquizofrênico e começou a pular como um sapo no palco para chamar a atenção dos internos. Essa ação fui súbita, foi fruto de uma típica resolução de problema defendida por Spolin ao se tratar do jogo teatral.
Arrisco inferir, portanto, que o corpo-perceptivo é um corpo aberto a percepção das externalidades por meio de todos os sentidos: para Lazzaratto (2000) um corpo sujeito à afecções; para Arruda (p. 2, 2016) sujeito à incidências; em Stanislavski, uma relação psico-física, integrando conteúdos de dentro com os de fora, psiché e techné.
Para finalizar com uma pausa para o humor, ao rascunhar a cena do aeroporto, a última, por sinal, a professora disse que tínhamos de fazer a esteira. Como? Oras, já fizemos um grande sofá, quadros e esculturas conhecidas mundialmente, paredes de um quarto, o que haveria de tão dificultoso numa esteira de um aeroporto? Resultado:
Depois de rascunharmos a última cena até mesmo para resgatarmos aquela energia passada, foi a hora de o Alberto, meu personagem, passar mal, tremer por ter sido envenenado pela Clarice após a discussão. A ação de tremer foi uma composição insurgente da aula de Voz I. Dei o nome dessa ação de "A notícia", usando-me de uma substituição: quando recebi a notícia de que meu avô havia falecido.
Mas como reativar aquela energia pulsante da aula de Corpo, afinal? Como já citado em outras postagens, recorro a Stanislavski quando trata do detalhe imaginativo, um acréscimo de conteúdo ao material interno para que possamos resgatar a vida, uma manutenção do subtexto. Podemos também inserir uma regra de jogo nova para resgatar essa vida da ação, para provocar a dilatação mental (BARBA, 1995). Mas é válido salientar também que, a substituição, por se tratar de trazermos a visualidade interna de uma questão nossa urgente ou uma questão catastrófica - como no meu caso -, pode por si só gerar a vida de que a cena carece, contudo, também é lícito sublinhar que a repetição dessa ação pode sim comprometer essa pulsação, daí precisamos nos recorrer às ferramentas herdadas por tantos teatrólogos.
A CENA DO HOSPÍCIO
Essa cena trata-se do momento em que Alberto recebe uma mensagem de Clarice via telepatia informando que ela o perdoou e que escondeu as joias na tão preciosa cadeira. Alberto, então, no meio da loucura do hospício cujos internos estão enfurecidos com a situação antecedente, grita para todos que tem um plano, então todos se movimentam para a fuga, fuga esta resultado da cena de Jogos criada por mim, Juliana e Caio com duas regras de jogo: aumentar o tom de voz gradativamente e trocar uma peça de roupa à medida que for falando.
Dessa vez a cena tinha muitos atores e nem todos se propuseram a cumprir com a segunda regra, então achei que a cena perdeu um pouco de potencial, em contrapartida, o contingente de "loucos" no palco promoveu uma plasticidade corporal e vocal muito intensa além das diversas visualidades de "quens" e suas respectivas ações.
Essa cena careceu de um esforço interno da minha parte, porque a primeira vez que a fizemos saímos do anfi-teatro envaidecidos de tão completa que foi a cena no sentido de plasticidade, visualidade, estrutura de jogo, organicidade, ação sobre o outro, alternância, enfim, foi uma cena que superou as nossas expectativas, logo, a preocupação em afetar como na última vez, teoricamente mais possível por conta do número de atores, foi imediata.
Lazzaratto (2000) trata em seus estudos sobre o campo de visão do corpo-perceptivo², um "corpo aberto a impregnações" sugerindo que o "ator deve compreender as coisas por meio de seu corpo: ação-reflexão-nova ação." Na referida cena essa foi exatamente a ferramenta que me utilizei para resgatar a energia, o fogo, a vida da cena. No palco que não tive a habilidade de criar uma nova regra de jogo, nem de fazer alguma substituição, mas o corpo-perceptivo me fez absorver as outras cenas e levou meu corpo a uma ação. A grande verdade é que essa lucidez súbita do Alberto o traria a razão de volta, contudo Alberto se permaneceu esquizofrênico e começou a pular como um sapo no palco para chamar a atenção dos internos. Essa ação fui súbita, foi fruto de uma típica resolução de problema defendida por Spolin ao se tratar do jogo teatral.
Arrisco inferir, portanto, que o corpo-perceptivo é um corpo aberto a percepção das externalidades por meio de todos os sentidos: para Lazzaratto (2000) um corpo sujeito à afecções; para Arruda (p. 2, 2016) sujeito à incidências; em Stanislavski, uma relação psico-física, integrando conteúdos de dentro com os de fora, psiché e techné.
Para finalizar com uma pausa para o humor, ao rascunhar a cena do aeroporto, a última, por sinal, a professora disse que tínhamos de fazer a esteira. Como? Oras, já fizemos um grande sofá, quadros e esculturas conhecidas mundialmente, paredes de um quarto, o que haveria de tão dificultoso numa esteira de um aeroporto? Resultado:
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Notas
Notas
¹ O termo pesquisAtor foi forjado pelo Prof. Dr. Armando Sergio da Silva para ilustrar as
atividades dos ¨atores-pesquisadores¨ do Centro de Pesquisa em Experimentação Cênica do
Ator na USP. Ver SILVA, A. S. CEPECA, Uma Oficina de PesquisAtores. São Paulo: I.O.,
2010. (ARRUDA, p. 1, 2012)
² Ver em LAZZARATTO, M. O Campo de Visão e o Corpo-perceptivo. Disponível <em http://www.celiahelena.com.br/olhares/index.php/olhares/article/view/5>.
² Ver em LAZZARATTO, M. O Campo de Visão e o Corpo-perceptivo. Disponível <em http://www.celiahelena.com.br/olhares/index.php/olhares/article/view/5>.
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