Uma regra deu errado, mas tudo foi perfeito. Possível?
Jogos Teatrais é, sem dúvida, uma das melhores aulas da vida. Se não for a melhor. Mas como percebemos que o conceito das coisas é a vista de um ponto e não um ponto de vista, deixemos a discussão para outro contexto.
Nas aulas de jogos estávamos sendo orientados a trabalhar com uma regra apenas, aquela deliciosa fase de experimentação. Pois bem, hora de ousar um pouco mais e colocar mais energia em cena.
Grupos de até 5 pessoas. A regra geral é: fazer uma cena com 3 regras de jogo. Não podemos esquecer que são jogos de improvisação e que possuem uma estrutura operacional, a tríade quem, onde e o quê.
Nossa tríade:
Quem: 3 criminosos.
Onde: No presídio.
O quê: Fugindo do presídio pelo bueiro.
Nossas regras:
Regra 1: trocar algum acessório ou objeto do corpo com o outro, o outro deve prosseguir com o processo.
Regra 1: trocar algum acessório ou objeto do corpo com o outro, o outro deve prosseguir com o processo.
Regra 2: começar no cochicho e aumentar o volume da
voz a cada vez que houver a troca da regra 1.
Regra 3 (que não deu certo): imitar o gesto que a pessoa de fora do diálogo fizer.
Primeiramente pensamos nas regras. É! Começamos do final. Depois na tríade. Claro que na discussão formos diversos "quens". Mas estava preestabelecido que estaríamos na prisão. As dúvidas de sempre: quem será o homem, a mulher, o gay? E seus nomes? Toda aquele minuciosidade de informações. Detalhe: todos tínhamos nomes, mas na cena não lembramos, contudo, introjetamos bem o nosso papel.
Já que começamos tudo do final, farei o mesmo nesta redação. A regra 3 não pôde acontecer. Para que ela fosse possível, tínhamos de um olhar o outro, mas o bueiro era estreito demais, tivemos de fazer a filinha ou entupiríamos nosso "onde".
A regra 2 foi crucial. Encaixou perfeitamente na estética da peça. Ora, se estamos fugindo, foragidos da polícia, por que começar a cena fritando? Em contrapartida, estamos com humor alterado, com medo de sermos pegos, em algum momento toda aquela tensão precisaria explodir, até porque aconteceram alguns infortúnios no caminho. A Juliana, por exemplo, acreditava que não ia caber no buraco, o Caio foi na frente e me deixou no meio sozinho e fiquei com medo de não conseguir, tudo isso fez com que explodíssemos.
Sobre a regra 1, eu tinha deixado claro de que não ia tirar a camisa. Quero externar aqui uma particularidade: tenho complexos com meu corpo e jamais tiraria a camisa em público. Nem quando vou à praia fico sem. No entanto, quero enfatizar que o motivo que me levou às Artes Cênicas foi a busca pela autoaceitação, a potencialização do meu corpo e de minha mente trabalhando numa organicidade perfeita. Motivos muito mais terapêuticos que profissionais. Minhas expectativas têm sido atendidas.
No final, fizemos a grande ciranda de conversa e fomos apresentando nossas regras e outras particularidades. A professora pontuava suas observações, o que deveria ser melhorado, recorria às teorias também para que explanar cientificamente o que estávamos fazendo. E, quero expor o orgulho que eu e meu grupo sentimos quando a professora disse que tinha absolutamente nada para falar a respeito da nossa cena. Nos envaidecemos por alguns minutos. Tudo foi perfeito, mesmo com a regra que deu não aconteceu. Por isso a perfeição também é a vista de um ponto.
No palco esquecemos quem somos, abrimos mão de nossos impulsos que nos representam, para representar o personagem, contudo, não fugimos de nós, estamos ali, inseridos numa narrativa, expostos num contexto diegético desconhecido em que, ao mesmo tempo que precisa ser encenado, precisa ser construído. Estamos presentificados. Tudo que encenamos possui a nossa história. Em nome do personagem, da regra, do teatro e minha superação, arranquei a camisa sem pensar. Foi a impulsividade que estava entorno do personagem no momento. Aquilo foi vivificante. Senti só depois a felicidade de ter me enfrentado e me vencido.
Viva às Artes Cênicas. Recursos terapêutico poderosíssimo!
Eis a nossa performance:
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